Genética pode influenciar política

 Deu no Correio Braziliense
 Paloma Oliveto    31/10/2010
Pesquisa indica que variante genética pode influenciar posição política  
Os cientistas, no entanto, afirmam que os fatores sociais certamente pesam na hora do voto
 Muitas promessas, um programa de governo convincente e uma boa dose de carisma não bastam na hora de conquistar votos. Para saírem vitoriosos nas urnas, os candidatos precisam torcer para que os genes dos eleitores deem uma ajudinha. Uma pesquisa recém-publicada pela Universidade de Cambridge, nos Estados Unidos, acrescentou mais um elemento na composição da ideologia política: uma variação genética que influencia nas opiniões liberais ou conservadoras.

A ideia pode soar esdrúxula para quem está acostumado às teorias sociológicas a respeito das convicções dos eleitores. Mas, de acordo com o grupo de pesquisadores, que investigam o tema há cinco anos, “cada vez mais, está ficando aparente que a ideologia política tem um elemento que está enraizado em predisposições inatas”. Eles argumentam que “teorias sociais e genéticas não precisam ser estranhas umas às outras”. “De fato, é provável que os genes influenciem a ideologia política parcialmente, regulando a forma como nós reagimos ao contexto social”, afirma o artigo.

Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores se focaram em uma variante genética já conhecida por influenciar o comportamento social. O gene DRD4 é um receptor de dopamina, neurotransmissor que processa no cérebro as respostas emocionais do indivíduo a acontecimentos específicos, além das sensações de prazer e dor. Algumas pessoas possuem uma variante neste gene, a 7R, associada a um comportamento amigável e liberal.

O principal autor do estudo, James Fowler, professor da Escola de Medicina e da Divisão de Ciências Sociais da Universidade da Califórnia, explicou ao Correio que a ideia da pesquisa foi investigar se o gene com a variante, DRD4-7R, também desempenhava um papel nas escolhas políticas dos eleitores. Fowler e seus colegas analisaram dados de 2 mil indivíduos que participaram de uma pesquisa nacional de saúde, nos Estados Unidos. Ao cruzar os dados genéticos com as informações sociais dos entrevistados, os pesquisadores constataram que aqueles que possuíam a variante tendiam, na idade adulta, a se tornarem liberais em seus posicionamentos políticos.

“Mas isso acontecia somente se, na adolescência, eles tivessem uma vida social ativa”, diz Fowler, explicando que os fatores ambientais influenciam a ideologia política, apesar dos genes. “As pessoas que possuem um grande número de amigos (característica de quem tem a variação genética) estão expostas a uma grande variedade de normas e estilos de vida, o que pode torná-los mais liberais, na média”, diz Fowler. “É a interação crucial de dois fatores — a predisposição genética e a condição ambiental de ter muitos amigos na adolescência — que está mais associada a ser mais liberal”, explica.

Segundo o pesquisador, a tendência foi verificada em indivíduos diversos, independentemente de etnia, cultura, sexo ou idade. Fowler enfatiza a interação dos fatores para evitar que se pense na existência de “fenótipos” liberais ou conservadores. “Não somos robôs. A ideia de um ‘gene do voto’ é idiota. Comportamentos sociais complexos são o resultado de centenas de genes interagindo com centenas de fatores sociais”, destaca.


Participação

Essa não foi a primeira vez que James Fowler estudou a influência dos genes no processo eleitoral. Ele conta que, em uma pesquisa anterior, foi possível constatar que as variantes genéticas também estão associadas à participação na vida política — nos Estados Unidos, o voto é facultativo. No estudo, os autores analisaram dados de 1.202 gêmeos idênticos e bivitelinos e descobriram que os genes influenciam em mais de 50% as chances de uma pessoa participar ou não das eleições.

Fowler e o pesquisador Christopher Dawes, da Universidade da Califórnia, mostraram que as pessoas com uma variante no gene MAOA eram mais propensas a votar em 2000, durante as eleições presidenciais dos Estados Unidos. Eles também descobriram uma conexão entre uma variante do gene 5HTT e a participação eleitoral.

O primeiro estudo foi baseado nas intenções de votar dos moradores de Los Angeles. Ao comparar gêmeos idênticos e não idênticos, os cientistas constataram que o comportamento eleitoral dos univitelinos, que partilham 100% de seus genes, é significativamente mais similar, comparando-se com os bivitelinos, que só têm em comum 50% do material genético. Para verificar o resultado, Fowler e Dawes examinaram dados de um estudo de saúde pública realizado com adolescentes entre 1994 e 2002 no estado da Califórnia. Entre gêmeos idênticos, 72% da decisão de participar de uma eleição está ligada aos genes. Isso não significa apenas votar, mas fazer doações às campanhas, entrar em contato com os diretórios, participar de passeatas etc.

Assim como a variante DRD4-7R, que está ligada à tendência mais liberal do eleitor, os genes 5HTT e MAOA estão relacionados ao comportamento social. Ambos exercem uma forte influência na regulação da serotonina, neurotransmissor responsável por sensações como medo, confiança e interação. Quanto mais diversificados são esses genes, maior a probabilidade de o indivíduo participar da vida política. Segundo Fowler, os resultados também sugerem que, ao contrário do que se imagina, a influência da opinião dos pais não é tão grande no comportamento político dos filhos. O pesquisador diz que pais e filhos costumam ter padrões eleitorais similares, o que sempre é interpretado como um comportamento aprendido. Porém, ele diz que seus estudos mostram que, na verdade, esses comportamentos são herdados.


Outras investigações

Não é só o discurso - ou os genes - que influenciam a preferência do eleitor. Diversas pesquisas mostram que fatores como aparência física ou gênero podem desempenhar um importante papel na hora de votar.

Voto na beleza
A mudança de visual da candidata à presidência pelo PT, Dilma Rousseff, foi um assunto muito comentado nas eleições que se encerram hoje, pois a importância que o eleitor dá à imagem de candidatas mulheres também já foi tema de pesquisas. Um estudo da Universidade Northwestern, nos Estados Unidos, descobriu que, para votar em uma mulher, os eleitores tanto do sexo masculino quanto do feminino levam em conta, principalmente, a aparência da candidata. Quanto mais atraente, mais votos uma mulher pode arrebanhar. O comportamento foi considerado preconceituoso pela principal autora do estudo, Joan Y. Chiao. “Enquanto a boa aparência é o que mais importa na hora de um homem votar em uma mulher, ao votar em candidatos do sexo masculino, o que eles mais consideram é a competência.”

Tudo a seu tempo
O que conta mais? Palavras bonitas ou concretas? De acordo com uma pesquisa da Universidade de Minnesota, o conteúdo da mensagem política afeta o eleitor de diferentes formas, dependendo de quando o discurso é feito. Ao longo da campanha, as palavras apaixonadas fazem mais efeito. Na reta final, porém, a objetividade conta mais. “Imagine que você vá de férias para Cancún daqui a seis meses. Você provavelmente vai pensar sobre praias, pôr do sol e outras coisas abstratas. Mas se você for viajar amanhã, você estará pensando em táxis e cartões de embarque, questões concretas. Da mesma forma, quando está longe de escolher o candidato, o eleitor é mais propenso a pensar em termos abstratos. À medida que a escolha se aproxima, ele coloca mais peso nos detalhes”, explicou o autor do estudo, Akshay Rao.

Sem feminismo
Mulher vota em mulher? Se assim fosse, as eleições já estariam definidas no Distrito Federal e no Brasil, já que o número de eleitoras é maior do que os votantes do sexo masculino. Uma pesquisa da Universidade de Wisconsin mostrou que, ao contrário do que se possa imaginar, mulheres não tendem a votar em seus pares. Para elas, há questões mais importantes do que o gênero, como a filiação partidária e as visões políticas. “Para avaliar as candidatas femininas, as mulheres levam em conta sua personalidade e suas opiniões políticas. Às vezes, isso pode levá-las a votar mais em mulheres do que homens, mas, mesmo nessas situações, o sexo do candidato é apenas uma entre muitas considerações importantes”, constatou Kathleen Dolan, principal autora do estudo.