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Comendo pela mão de Lula |
A descrição das concessões do "governo Dilma" no artigo abaixo é boa, mas a explicação é superficial. Dilma teria tido o apoio que recebeu, nas eleições, dos setores mais retrógrados e corruptos do país, se já não estivesse comprometida com essas concessões? Como é que ela poderia, agora "descer da torre de marfim", e "se explicar honestamente aos seus milhões de eleitores"? Ela foi um fantoche, com uma imagem de "grande administradora" artificialmente criada, para prolongar as "travessuras" do governo anterior. Lula e o PMDB já nem disfarçam mais - Dilma foi descartada ontem do programa eleitoral do PMDB, onde Lula pontificou como grande estrela. (RX)
03/06/2011 - 07h00
Márcia Denser*
O fato de Dilma ter reconduzido Antonio Palocci ao centro do governo, para mim, foi um mau sinal. Desde o anúncio da vitória nas eleições presidenciais, o mesmo Palocci exonerado por Lula, o mesmo Palocci dogmático, de rígidas posições neoliberais, o mesmo Palocci envolvido em questões ilícitas, tanto no passado como agora no presente. É verdade, como diz Nassif, que o governo Dilma está apenas começando, contudo seria importante relatar alguns fatos recentes que, na melhor das hipóteses, nos levam à perplexidade.
Para o cientista político Paulo Kliass, na Carta Maior, para quem estivesse ausente do país há duas semanas, algumas hipotéticas manchetes sobre a Previdência Social, o Código Florestal, o ministro da Casa Civil e a privatização de aeroportos seriam um sinal de grave alteração na cena política brasileira. Tipo: “Governo anuncia desoneração da folha de pagamento para Previdência Social, antiga reivindicação do patronato”, ou “Base parlamentar do governo aprova alterações no Código Florestal que favorecem o agronegócio e comprometem o futuro do meio-ambiente”, ou “Ministro da Casa Civil declara que a multiplicação de seu patrimônio por vinte vezes é lícita, pois ocorreu quando estava fora do governo”, ou ainda, “Presidente anuncia privatização dos principais aeroportos do Brasil”.
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Tentando explicar o inexplicável, Nassif observa que “Collor e Jânio caíram não por malfeitos, bebedeiras ou quetais, mas porque enfrentaram o Congresso.
Lula sobreviveu não apenas por sua liderança carismática, mas porque soube recompor a maioria parlamentar. Aliás, causa espanto que intelectuais sofisticados, como Marcos Nobre, considerem que concessões a aliados signifiquem o fim "do grande projeto político" de Dilma. Este mundo maravilhoso, em que presidentes podem governar como executivos, sem concessões, costuma habitar o imaginário de não-políticos – não de cientistas sociais.”
O fato de, no início do governo, Dilma agir no sentido de “baixar a fervura política” – sua ida ao aniversário da Folha, sua discrição ao falar pouco, sua ênfase na questão dos direitos humanos – rendeu alguns resultados positivos, mas, ainda segundo Nassif, “esvaziou o discurso político.
Mais ainda, mesmo não se iludindo quanto aos propósitos da velha mídia, caiu na armadilha de vestir a roupa de Margareth Thatcher brasileira, a dama-de-ferro que resolve todas as pendências políticas endurecendo o jogo, que coloca o objetivo técnico acima das demandas políticas. Não há veneno maior na vida de um governante do que a ilusão dos plenos poderes, de onipotência. Envenena o ambiente político. Sendo uma ficção – porque não existem plenos poderes em ambiente democrático – é uma imagem facilmente desconstruída no mundo não-político. Basta a primeira crise para trazer uma decepção diretamente proporcional à admiração gerada pela falsa idéia da onipotência.”
Para Nassif, “a vulnerabilidade de Dilma não reside em eventuais concessões ao PMDB – ainda que doa na alma de qualquer cidadão. Reside em seu isolamento político e do seu governo, algo que poderá ser corrigido daqui para frente. Ela se isolou não apenas dos aliados – a arrogância de Antônio Palocci com um vice-presidente foi sintomática -, mas também impôs uma lei do silêncio ao primeiro e segundo escalão, que acabou comprometendo o fluxo de informações e análises, inclusive os contatos em off. A grande batalha do governo Dilma ocorre na frente econômica. Se não sustentar o crescimento, dança; se deixar a inflação aumentar, dança.
Montou-se uma estratégia complexa de desarmar gradativamente a armadilha dos juros altos, em um mundo fundamentalmente instável. Mas não se comunica.” Eis a questão.
É importante que a presidente volte a fazer política. E isso não significa apenas conversar com aliados e ampliar as concessões – tudo isto ela já está fazendo até demais, conforme retro e supra citado – mas retomar os contatos com a opinião pública, limpar os canais. Naturalmente ninguém espera que Dilma vá repetir o estilo Lula – falante e grande negociador . Basta descer da torre de marfim. E explicar-se aos seus milhões de eleitores.
Não é pedir muito.
*A escritora paulistana Márcia Denser é Mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, pesquisadora de literatura e jornalista.
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